São quase 3 da matina e neste
momento a minha luta é apenas uma: a de combater as pálpebras que insistem em
fechar.
Ligo o pc e vou navegando sem
destino e sem qualquer esperança de que alguém tenha já publicado o que quer
que seja acerca do UTSF. A única intenção é mesmo a de me manter acordado, pois
não quero correr o risco de adormecer com o pé enrolado em gelo.
Olho para o monitor, mas não vejo
nada. Na verdade vejo o filme do dia a passar-me diante dos olhos. O amanhecer debaixo de uma chuvinha irritante e a rápida descida até ao rio.
Sinto a chuva a penetrar-me até
aos ossos e logo em seguida o sol a incomodar-me na nuca.
Oiço riso e gargalhadas entrecortadas
por protestos vindos não sei bem de onde.
Vejo-me submerso até à cintura.
Levanto os olhos e vejo a serra, o céu pesado. Regresso aos penedos e vejo um companheiro
que se estatela de uma altura de quase 2 metros em cima de uma laje e que
berra como um condenado.
Pergunto-me o que faço eu aqui.
Vejo um punhado de sorrisos em
rostos que olham na minha direcção e oiço palavras de ânimo e incentivo. Estou
num qualquer abastecimento rodeado de companheiros incansáveis que hoje trocaram
os trilhos pela solidariedade.
Estou de novo no trilho e vou
subindo penosamente, para logo em seguida descer com dificuldade, escorregar ao
longo de um penedo, raspar um braço num silvado, bater com uma canela num xisto
pontiagudo ou a cabeça num troco atravessado ao nível dos olhos mas que não vi,
fruto da reflexão do momento: a noite mal dormida, o abastecimento que não
chega, a Besta que vai ter de ser vencida com bastões a atrapalharem, o relógio
que não pára, a perna direita que já não dobra … o desânimo prestes a apoderar-se de
mim e a Patrícia a vir uma vez mais em meu socorro. A minha incansável
companheira de jornada, que, do primeiro ao último metro desta aventura, me
aturou protestos, blasfémias e amuos; puxando constantemente por mim.
Subimos ravinas intermináveis e descemos
vales sem fim. Caminhamos em leitos de rios, mudando incessantemente de margem,
enchendo os cantis na mesma água onde mergulhávamos o corpo, tentando usufruir de
tudo o que a Freita tem para oferecer a quem se aventura pelas suas entranhas.
Recordo-me de sentir o meu próprio
sorriso a tocar-me nas orelhas quando no abastecimento dos 60km retiro o cronógrafo
da mochila e verifico que estamos com 14 horas de prova. Faltava a subida da Lomba
e toda a Mizarela – que provavelmente seria já vencida de noite, mas mesmo com
as dores do pé, que me incapacitavam desde as 11 horas de prova, eu tinha a
certeza de que a aventura teria final feliz.
Por falar em pé; é melhor
desentrapá-lo e ir dormir.
Obrigado Patrícia.
6 comentários:
Parabéns!
Bela prova, tão bem descrita aqui. Já descobrimos a melhor forma de transpormos a UTSF: Fazê-la separados por alguns minutos. Assim, se eu baquear hás-de chegar em meu auxílio. Eu bem te dizia que não ias ficar "a banhos" algures entre os 30 e os 40.
Abraço!
Pois, parece que somos incompatíveis :)
E sim, é uma boa técnica: se quebrares posso sempre apanhar-te.
Agora aguardo pela tua crónica.
Aquele abraço
Mts Parabéns pela bela Prova. Vocês são a Prova de que no próximo ano me poderei aventurar pela Freita. Gd abraço e melhoras rápidas.
Pois, "se vocês conseguem eu também consigo", ah ah ah
Aquele abraço, Mauro.
Parabéns pela conquista e pelas palavras aqui deixadas, penso que os "outros" bichos poderão incluir dinossauros pois este teu blog já começa a ser dinossaúrico na blogosfera corredora.
Abraço.
António Almeida
Obrigada João.
;)
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